Desafios invisíveis de trabalhar em casa: entre liberdade e limites
#07 | O home office ensina que produtividade também é saber dizer 'não' às distrações.
Em Due Tramonti, Rodrigo Cotrim de Carvalho nos convida a refletir sobre as ambivalências da carreira e da vida, explorando temas que nos afetam a partir de múltiplas perspectivas. Ele compartilha suas observações de deslocamentos e diálogos, cultivando novos olhares sobre nossas jornadas profissionais e pessoais.
Oi!
Trabalhar em casa é um sonho para muitos: liberdade para definir horários, proximidade do conforto do lar e o fim do deslocamento diário. Mas quem vive o home office na prática sabe que a experiência vai muito além desses benefícios aparentes. É um jogo constante de equilíbrio, onde a linha entre vida profissional e pessoal é tênue, e a ausência de barreiras físicas traz à tona desafios inesperados — interrupções, distrações e a luta por respeito ao espaço pessoal.
Desde que comecei a trabalhar remotamente, ainda em 2010, encarei o home office como uma escolha. Mas, ao longo dos anos, especialmente com as mudanças trazidas pela pandemia e pela minha migração para outro país, essa escolha se transformou em necessidade. Hoje, a liberdade que antes me encantava também traz momentos de aprisionamento: pela falta de limites, pela conectividade constante e pela dificuldade de desconectar.
Este segundo texto da série que me propus a fazer sobre home office é um convite a refletirmos juntos sobre essas questões e, quem sabe, encontrar formas de tornar essa experiência mais leve e produtiva.
Leia aqui o primeiro texto da série
Impondo limites e protegendo o espaço pessoal
Uma das maiores ilusões do home office é a ideia de que estar em casa significa estar disponível. Isso se manifesta de várias formas: mensagens de WhatsApp enviadas fora de hora, parentes que batem na porta durante reuniões importantes ou amigos que ligam com frases infames do tipo: "Já que você está em casa, então não custa nada...", ou o famigerado “Oi, tá muito ocupado?”. Por muito tempo, eu mesmo alimentei essas dinâmicas, acreditando que era possível atender a todos sem prejuízo ao meu trabalho. Spoiler: não é. Não mesmo.
No início, negligenciar limites parecia inofensivo. Afinal, a gente tem a ilusão de que flexibilidade é para isso, certo? Mas, com o tempo, percebi que isso impactava diretamente minha produtividade e meu bem-estar. O simples fato de ser interrompido em meio a uma tarefa importante me tirava do foco por longos minutos — inúmeras vezes. Além disso, a ausência de fronteiras claras fazia com que meu espaço — físico e mental — se tornasse vulnerável a invasões constantes. E se tornou.
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Como ando tentando criar um espaço mais protegido?
Estou definindo melhor as minhas fronteiras, tanto visuais quanto simbólicas.
Por exemplo: voltei a me vestir de forma mais formal para começar o dia de trabalho. Não parece, mas vestir uma calça, pentear o cabelo e organizar minha aparência (caso eu precise aparecer na câmera) já desperta uma postura diferente. Sento de forma mais ereta, deixo meu espaço organizado e funcional, e consigo respeitar melhor os horários de início, pausa e fim do trabalho.
Fecho a porta do escritório, principalmente durante reuniões, mesmo quando estou sozinho. Tenho três gatos — consegue calcular o tamanho do assédio? Uso dois tipos de fones de ouvido: um menor, para interações simples, e outro maior, daqueles que isolam o som, quando preciso editar conteúdo audiovisual ou mergulhar em uma tarefa. Esses objetos se tornam verdadeiros portais, limites e fronteiras que atravesso diariamente para conectar meu corpo e minha mente ao que preciso fazer.
Sobre a dificuldade de foco e o papel das distrações
Com o tempo, o home office amplificou as distrações pra mim. São estímulos por todos os lados: a obra ao lado, o celular vibrando na mesa, aquele lembrete mental de que você precisa lavar a louça, aspirar a casa, trocar a areia do gato ou molhar as plantas. E há, claro, as tentações digitais: as mídias sociais sempre à mão ou o convite de assistir "só mais um episódio" no intervalo do almoço. Em alguns dias, minha concentração é tão frágil quanto uma bolha de sabão.
Mas a questão vai além da produtividade. Cada interrupção, por menor que seja, carrega uma carga emocional: a frustração de ter perdido o fio da meada, a sensação de improdutividade e até a culpa por não conseguir manter o foco.
Percebi que a solução não está em eliminar todas as distrações — algo impossível em um mundo tão conectado —, mas em criar um sistema que diminua o poder delas sobre mim.
Sugestões de estratégias para gerenciar as distrações
Blocos de trabalho focado: Adotar algo próximo à técnica Pomodoro tem sido eficaz para mim. Divido o trabalho em intervalos de 45 minutos (a técnica sugere 25), seguidos de pausas curtas de 15 minutos. Isso funciona especialmente bem na parte da manhã, que tenho reservado para ser criativo, longe do contato com o mundo externo. É meu momento mais solitário, onde consigo planejar e executar com mais fluidez1.
Personalize seu ambiente: Um espaço funcional e agradável reduz estímulos indesejados. Recentemente, mudei a disposição dos móveis do meu escritório. A mudança, embora simples, trouxe um impacto positivo. Para mim, isso inclui uma cadeira ergonômica, boa iluminação e uma mesa organizada (mas confesso: uma mesa lateral para bagunça ajuda!).
Redefina sua relação com a tecnologia: Desative notificações, use aplicativos que bloqueiam redes sociais durante o trabalho e estabeleça horários fixos para checar e-mails e mensagens. Isso cria uma rotina de consumo digital menos reativa e mais intencional.
Essas práticas não eliminam completamente as distrações, mas ajudam a neutralizar seus efeitos. E, nos dias em que ainda me sinto disperso, aprendi a ser mais gentil comigo mesmo. Foco não é sobre perfeição, mas sobre consistência.
Construindo um Home Office mais saudável
Trabalhar em casa não é apenas uma escolha de estilo de vida; é uma jornada de autoconhecimento e adaptação constante. Para que funcione, é preciso mais do que disciplina: é necessário estabelecer limites claros, criar ambientes que favoreçam o foco e, acima de tudo, respeitar o próprio tempo e as próprias necessidades.
Neste texto, compartilhei pensamentos sobre como proteger o espaço pessoal e gerenciar distrações, mas o trabalho remoto traz outros desafios igualmente complexos, certo? No próximo, quero explorar um tema especial que tem me afetado: a solidão no home office. Pretendo pensar junto com você sobre o impacto emocional de trabalhar sozinho, estratégias para lidar com a desconexão e como encontrar um equilíbrio saudável entre independência e conexão.
E você? Quais são os maiores desafios que enfrenta no home office? Fez sentido o que trouxe pra você? Vamos conversar e, juntos, transformar essa experiência em algo mais humano e significativo. Conta pra mim e pra Pri como você lida com estes desafios.
Inté!
“As opiniões expressas pelos colunistas são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem, necessariamente, a opinião da Carreiras Múltiplas.”
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Nossa , depois que tive filhos , imigrei e vivi a pandemia não conseguia de jeito nenhum fazer home office, mentalmente eu não conseguia me desligar das demandas da casa e da família, e também não queria ficar sozinha. Tive que sair pra poder ser novamente produtiva. E, pouco a pouco, estou conseguindo voltar a produzir de casa, mas sem perspectiva de que isso seja 100% do tempo . Curiosa pra ler o próximo 😉