A estética da espera: o que existe entre o agora e o depois?
Talvez seja no espaço entre a ação e a resposta que mora a beleza sutil do tempo.
Em Due Tramonti, Rodrigo Cotrim de Carvalho nos convida a refletir sobre as ambivalências da carreira e da vida, explorando temas que nos afetam a partir de múltiplas perspectivas. Ele compartilha suas observações de deslocamentos e diálogos, cultivando novos olhares sobre nossas jornadas profissionais e pessoais.

Oi!
Esperar é, quase sempre, uma experiência subestimada. A gente espera o elevador, a resposta de uma mensagem, o começo de um novo ciclo e, na maior parte das vezes, esse tempo entre o agora e o depois nos parece um incômodo. Um vazio a ser preenchido. Mas será que a espera é mesmo um intervalo sem valor ou estamos apenas desacostumadas/os a vê-la com outros olhos?
Vivemos em uma época que valoriza a velocidade, a eficiência, a entrega imediata. “Esperar” soa como o oposto de produzir. Como se estivéssemos perdendo tempo. E talvez por isso a espera tenha sido colocada do lado “errado” do relógio: o lado da incerteza, da ansiedade, do que ainda não aconteceu. Mas e se fosse o contrário? E se a espera fosse, na verdade, um espaço fértil de preparação, observação e presença?
Quando a espera vira tempo criativo
Há algo curioso que acontece quando somos forçados a esperar. O tempo parece desacelerar e, com isso, ganhamos a chance de reparar em coisas que normalmente passaríamos por cima. O som da chuva caindo no telhado, o cheiro do café que esfria devagar, o gesto automático de alguém ajeitando o cabelo no reflexo da janela. Pequenas cenas que só se revelam quando o ritmo diminui.
Na fotografia, por exemplo, existe uma técnica chamada longa exposição. Ela exige tempo, paciência e a habilidade de lidar com o que está em movimento. É uma forma de capturar o que o olho humano normalmente não vê. E é curioso pensar que essa técnica se assemelha ao que vivemos nos momentos de espera: o mundo continua se movendo, mas algo em nós aprende a parar.
A espera como parte da experiência (e não como obstáculo)
A verdade é que nem toda espera é perda. Algumas são parte essencial do caminho. Esperar pode ser um ato de fé, uma forma de confiar que algo está em processo, mesmo que ainda invisível. E isso vale tanto para um projeto profissional quanto para uma relação ou para os ciclos internos que atravessamos sem saber direito onde vão dar.
Só que a gente não aprendeu a valorizar esse tipo de tempo. A lógica do “agora ou nunca” nos treinou para a urgência. Mas há muita beleza em deixar as coisas virem no seu ritmo, mesmo que esse ritmo não combine com o nosso calendário.
Talvez por isso tantos movimentos contemporâneos como o slow content, o slow fashion, o soft quitting estejam, no fundo, resgatando o valor de desacelerar. De não antecipar respostas. De se permitir habitar o entre.
Aceitar o tempo como ele vem.
A espera, quando não é apenas inércia, pode ser cuidado. Pode ser afeto. Pode ser escuta. Às vezes, é só quando a gente deixa de empurrar o tempo que ele finalmente se abre. Como aquela conversa que só acontece quando ninguém está com pressa. Ou aquele insight que aparece no banho, no metrô, na fila do pão.
Esperar é um jeito de estar e não apenas um parêntese na rotina. Pode ser desconfortável, sim. Mas também pode ser bonito, produtivo e cheio de significados que só o tempo revela.
E você, como lida com a espera? Consegue enxergar beleza nesse tempo entre o que foi e o que ainda vem?
Até breve!
PS: Se quiser ver como a espera pode ser transformada em imagem, recomendo buscar vídeos de “long exposure” ou cenas lentas de filmes como In the Mood for Love (Wong Kar-Wai). São pura poesia visual.
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Rodrigo, obrigada por esse texto - ele veio como um bálsamo de paz para mim! Estou quase saindo de licença-maternidade (um período em que, naturalmente, faz com que todo o “resto” da vida entre em modo de espera) e, confesso, isso estava me afligindo um pouco. Acabei de ressignificar esse período, com a ajuda das suas reflexões. Obrigada ❤️