64 - Quando é que viramos máquinas sem botão de desligar?
“Tempo, tempo, tempo, tempo… és um dos deuses mais lindos.” — Oração ao Tempo, Caetano Veloso.
No início do ano, eu tive uma crise de coluna que nunca tinha acontecido. Eu tinha engrenado na atividade física – caminhadas de quase 1 hora todos os dias – e achei que aquela dorzinha que surgiu do nada era algum mal jeito por conta do exercício.
Dois dias depois do primeiro sinal de dor, eu estava na emergência do hospital com o diagnóstico de hérnia de disco na região lombar. Alguns milagres da indústria farmacêutica depois, a recomendação do médico foi fazer sessões de fisioterapia para aliviar as dores e aulas de pilates para fortalecer a região abdominal.
Pesquisei academias e estúdios de pilates perto de casa. Aqueles que tinham horários disponíveis estavam fora do meu orçamento. E aqueles que cabiam na minha realidade financeira, os horários eram o que chamamos pejorativamente de “horário de herdeiros”. Em uma delas, as aulas eram às 11h da manhã! Lembro que comentei com o Márcio que precisaria ser bancada por ele pra conseguir cuidar da minha saúde. Rimos. De nervoso!
Essa relação nada saudável com o tempo não é um privilégio meu. Contei aqui que rolou um debate saudável no grupo do WhatsApp da comunidade Carreira em Movimento sobre o assunto da falta de tempo e da correria da vida. Das trocas no WhatsApp, o tema transformou-se em pauta para o terceiro encontro da comunidade. Durante 1h30, expressamos todo nosso amor(?) e ódio por ele, *o tempo (será que faz sentido amar e odiar simultaneamente?).
Durante a facilitação, joguei uma pergunta para pensarmos juntos: como é sua relação, hoje, com o tempo?
O compartilhamento foi feito a várias mãos. Em um documento online, começamos a escrever frases sobre como vivíamos nossa relação com o tempo. As frases que surgiram são sensacionais. Vou colocar algumas aqui:
“Por que não é uma praia na segunda? Ou um mergulho ao meio-dia?”
“Essa noção de tempo ‘produtiva’ nos engole, nos aperta, nos desfaz.”
“Quem disse que não podemos ir a um cinema à tarde ou a um café ao amanhecer?”
“Quando foi que o tempo virou fracasso?”
“A vida é como um bolo, gosto de pensar; melhor saborear em fatias, um pedaço de cada vez.”
O tempo está passando rápido demais ou nós é que estamos passando mais rápido por ele?
Essas palavras ficaram na minha cabeça. Depois daquela conversa com a turma da Carreira em Movimento, refleti sobre como nos acostumamos a correr – sempre com esse relógio invisível batendo nas nossas costas. Como se fôssemos máquinas, sempre com prazos e entregas para cumprir. E sabe o que mais me chamou a atenção? Esse ritmo frenético, muitas vezes, vem de dentro da gente, não é só o mundo lá fora que exige isso. E aí vem a pergunta: será que estamos no controle ou estamos sendo controlados?
Foi um tempo de qualidade onde desabafamos toda a angústia que sentimos pela (falta de) tempo. Daquele encontro, saiu o Manifesto ao Tempo, um documento onde reunimos nossos sentimentos sobre essa relação desigual entre o tempo e nossas vontades. E olha o que surgiu:
"Temos fome de tudo e pressa de nada. Devoramos o tempo, mastigamos o ansiar, engolimos o porvir, e o que fica? Cuidado com a vida vazia disfarçada de compromissos cheios."
E o mais curioso? Esse ritmo acelerado, muitas vezes, parece vir mais de dentro do que de fora. Em um mundo onde tudo é sobre produtividade e entregas, será que conseguimos, juntos, reaprender a sentir o tempo de um jeito mais leve, menos sobre controle e mais sobre presença?
ps 1: a Fê Imperatrice, uma amiga que faz parte da comunidade Carreira em Movimento, escreveu um texto lindo sobre sua relação com o tempo. Além disso, amorosamente, ela adaptou o Manifesto ao Tempo e narrou uma nova versão. Não deixe de conferir neste texto.
Obrigada, Fê!
ps 2: o Manifesto ao Tempo é uma criação conjunta dos participantes da comunidade Carreira em Movimento. Um obrigada super especial a Eliana Pinto, Gabi Costa,
, Milene Fischer, Poli Souza, Pri Tescaro, e Thaty Nogueira. Ah, importante, o ChatGPT compilou as frases para deixar melhor organizado.Você pode ter perdido:
Na próxima edição
Vamos continuar a conversa sobre como avaliar a situação atual da sua carreira. Estou finalizando a parte 2 desse texto onde vou compartilhar um passo a passo para você colocar a mão na massa e terminar o ano refletindo sobre sua carreira.
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Que sabor.
Muito legal, Pri! Esse é um tema que eu adoro. Acabei de reler o livro "Calma" (The School of Life), uma reflexão interessante que ele traz é a falsa crença de que uma vida calma está destinada a "aposentados, desempregados ou pessoas que desistiram da vida", e que viver uma vida menos estressante não é algo glamouroso na nossa sociedade atual, como se viver dessa forma não pudesse ser uma escolha e sim algo pejorativo. Se você não leu ainda, recomendo!